sexta-feira, 28 de novembro de 2014

10ª Postagem: Em busca de um tratamento

Cirrose é um processo patológico irreversível que pode ser fatal. Portanto, é importante fazer o diagnóstico precoce para iniciar o mais depressa possível o tratamento que pode adiar ou evitar que surjam complicações mais graves. O único tratamento definitivo e eficaz para a cirrose hepática é o transplante de fígado, mas também pode haver melhoras se for possível suspender o agente agressor, no caso de álcool e drogas, ou combater o vírus da hepatite, que tenha originado a doença. E isso porque a capacidade regenerativa do fígado é muito grande: é possível ao órgão perder mais de dois terços da sua estrutura e a porção restante voltar a crescer até praticamente o tamanho normal. É algo semelhante ao que ocorre no transplante, em que o receptor recebe apenas uma porção do fígado do doador, que depois cresce. Como o transplante só está indicado em casos muito graves, nos outros casos deve-se tentar a detecção precoce e o tratamento das complicações, procedendo-se às intervenções necessárias.



Quanto à indicação, o transplante destina-se para o paciente portador de doença hepática aguda ou crônica em fase terminal. Existem algumas doenças nas quais as indicações são tranqüilas e aceitas de forma unânime. São aquelas que apresentam uma evolução conhecida, definida, e que têm pequena probabilidade de recidivar no fígado transplantado. As principais doenças com esse tipo de indicação são a cirrose biliar primária, a colangite esclerosante primária, a atresia de vias biliares, a hepatite crônica auto-imune e a insuficiência hepática aguda grave, também chamada de "hepatite fulminante". Evidentemente, em cada uma delas, existe um momento certo para o transplante, de forma a não indicá-lo muito precocemente, quando o paciente pode apresentar ainda mais alguns anos de vida produtiva, e também não indicá-lo muito tardiamente, quando as condições gerais do paciente estarão deterioradas e o resultado do procedimento não será tão satisfatório.
Vale lembrar que o transplante de fígado produz, com freqüência, rejeição. Discute-se a existência da rejeição chamada de superaguda, de natureza humoral. A rejeição chamada de celular aguda é verificada em 30% a 70% dos casos, especialmente nas primeiras duas semanas após o transplante, mas pode ocorrer em qualquer época após o procedimento. Há, ainda, a chamada rejeição crônica, provavelmente de natureza humoral. A grande dificuldade é manusear adequadamente os diversos esquemas conhecidos de imunossupressão para evitar as rejeições. Há padronizações, porém, que estão longe de acompanhar aquelas do ato operatório. A imunossupressão medicamentosa é obrigatória em todos os casos, mesmo naqueles em que já estão com a imunidade gravemente comprometida pela doença hepática. Aqui reside toda a dificuldade. A imunossupressão medicamentosa não pode ser excessiva a ponto de produzir infecções, nem ser leve o suficiente para permitir rejeições que, por sua vez, obriguem à utilização de drogas mais potentes. Esse equilíbrio é difícil de ser encontrado, pois são diferentes os pacientes, a idade, a condição clínica, a doença hepática, etc. Além disso, as drogas utilizadas são altamente tóxicas e produzem efeitos indesejáveis de monta em praticamente todos os casos.



De qualquer modo, o melhor a fazer para não desenvolver cirrose hepática é sempre evitar os fatores que podem desencadeá-la como: evitar o uso abusivo de álcool, usar preservativo nas relações sexuais e seringas descartáveis para evitar a contaminação pelos vírus das hepatites B e C, não descuide do tratamento para as hepatites B e C crônicas a fim de que não provoquem cirrose, procure vacinar-se contra hepatite B para evitar o risco de contrair essa doença. Principalmente se você tiver algum fator de risco como algumas doenças genéticas (por exemplo, Doença de Wilson), hepatite auto-imune ou cirrose biliar primária.
Com isso a gente encerra aqui o nosso blog, espero que ele tenha ajudado você a compreender melhor melhor o cotidiano de muitos brasileiros que tentam lidar com a doença. Meu objetivo não foi só trazer conhecimento técnico aos profissionais de saúde a cerca da cirrose, mas também fazê-los refletir sobre a necessidade de fazer um atendimento humanizado a esse tipo de paciente, que já se encontram bastante fragilizados e que não tem um chance de cura ceta. Espero ter atingido esse objetivo. Até próximo período!

Referência:
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-42301998000200011%27%27&script=sci_arttext
drauziovarella.com.br/dependencia-quimica/alcoolismo/cirrose/
http://www.abc.med.br/p/sinais.-sintomas-e-doencas/363564/cirrose+hepatica+definicao+causas+sintomas+diagnostico+tratamento+e+evolucao.htm

terça-feira, 25 de novembro de 2014

9ª Postagem: Hipogonadismo Central em Homens e Mulheres com Cirrose Hepática

A cirrose hepática (CH) é uma das doenças crônicas associadas ao hipogonadismo (HG), o qual tem etiologia variada em relação ao órgão-alvo do eixo gonadal que é acometido. Com base em um artigo publicado na Scielo sobre avaliação do Eixo Hipotálamo-Hipófise-Gônada e Prevalência de Hipogonadismo Central em Homens e Mulheres com Cirrose Hepática pudemos avaliar o HG intercorrente na CH de diferentes etiologias, em 82 pacientes (49 M/33 F).O hipogonadismo que acompanha a cirrose, independe da etiologia da cirrose, embora aparentemente seja maior na etiologia alcoólica, e incide em ambos os sexos. Esse hipogonadismo pode resultar de dano gonadal secundário ao álcool, da sobrecarga de ferro quando a etiologia da cirrose é a hemocromatose, da deficiência de zinco associada à cirrose, do mau estado metabólico induzido pela falência hepática e por causas independentes, como o uso de drogas ou presença de outras doenças.
Independente do órgão-alvo desencadeador do hipogonadismo do eixo hipotalâmico-hipofisário, os homens cirróticos hipogonádicos podem apresentar uma síndrome clínica decorrente de feminização (ginecomastia) ou associada à própria deficiência da testosterona. No presente estudo verificou-se que, nos homens, detectou-se diminuição da libido (68,8%), disfunção erétil (53,8%), pêlos de distribuição ginecóide (53,1%), atrofia testicular (55,3%) e ginecomastia (48%). Entre as mulheres, 18 (78,2%) apresentavam amenorréia em idade fértil. HG foi confirmado por níveis baixos de testosterona livre nos homens e de estradiol nas mulheres. Níveis altos de gonadotrofinas basais estabeleceram a etiologia gonadal do HG. O diagnóstico de alteração hipotálamo-hipofisária só foi possível através do teste do GnRH, onde o valor de pico do LH foi significativamente menor nos hipogonádicos. HG central foi predominante: 90,4% dos casos.
 A gravidade da CH, avaliada através da classificação de CHILD, mostrou correlação significativa com o HG.  A classificação de Child-Pugh é um fator preditivo razoavelmente confiável de sobrevida de várias doenças hepáticas e antecipa a probabilidade de complicações importantes da cirrose, como sangramento por varizes e peritonite bacteriana espontânea.Não houve associação significativa entre HG e sintomas isolados como diminuição da libido ou ginecomastia, concomitância de outras doenças, hiperprolactinemia ou uso de drogas.
http://www.scielo.br/pdf/abem/v47n5/a14v47n5.pdf
http://www.sbhepatologia.org.br/pdf/manual_hepatopatia_grave

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

8ª Postagem: Testes para avaliação de complicações e estágio da cirrose

Dispomos hoje de testes para avaliação de complicações e estágio da cirrose. São eles: Classificação de Child-Pugh, Plaquetas, Alfa-fetoproteína, FibroTest e MELD. Como já tratamos de alfa-fetoproteína nas postagens passadas, nessa postagem trataremos dos demais testes.

Classificação de Child-Pugh

Trata-se de uma estratégia utilizada por décadas, que consite na tentativa de agrupar em uma única classificação, ainda que grosseira, alguns dos fatores que seriam mais significativos no paciente com cirrose para prever o risco de submeter esses pacientes a um tratamento cirúrgico. O paciente cirrótico é classificado em três estágios (A, B e C) de acordo com o grau progressivo de complicações da cirrose;

Classificação de Child-Pugh1
ausente
1-2
3-4
ausente
leve
moderada/severa
Albumina
> 3,5
2,8-3,5
< 2,8
Bilirrubina total3
< 2,0
2,0-3,0
> 3,0
Tempo de protrombina4
1-4
4-6
> 6
Pontos:
1
2
3

A: 5-6 pontos
B: 7-9 pontos
C: 10-15 pontos

Notas: 1soma-se os pontos para cada um dos cinco itens; 2classificação de West Haven; 3na cirrose biliar primária, utilizar os seguintes valores de bilirrubina total: 1-4 (1 ponto), 4-10 (2 pontos) e > 10 (3 pontos);4segundos após o controle - é possível também utilizar o valor de RNI: < 1,7 (1 ponto), 1,7-2,3 (2 pontos) e > 2,3 (3 pontos)



A classificação de Child-Pugh, entretanto, é incapaz de prever o prognóstico (expectativa de vida), com um mínimo de precisão, quando avaliada individualmente, Hoje, é mais comumente utilizada a classificação de MELD/PELD para esse fim.

Plaquetas

A redução na quantidade de plaquetas no sangue (plaquetopenia) é comum em portadores de doenças hepáticas crônicas por cinco mecanismos principais: aumento do sequestro e destruição pelo baço aumentado (hiperesplenismo), redução na produção pela medula óssea, deficiência de ácido fólico, destruição por mecanismos imunológicos e por coagulação intravascular disseminada. Como a quantidade de plaquetas está grosseiramente relacionada ao grau de hipertensão portal (que leva à esplenomegalia e hiperplenismo), que por sua vez também é proporcional ao grau de fibrose hepática. Portanto, a dosagem de plaquetas têm sido utilizada como método indireto de avaliação do grau de fibrose hepática e como indicativo do risco de surgimento de varizes gastroesofágicas.

FibroTest®


É um método não invasivo que por meio de um algoritmo matemático com base em cinco variáveis (bilirrubina total, GGT, haptoglobina, alfa-2-macroglobulina e apoliproteina A1), com resultado entre 0 e 1, procura-se estimar o grau de fibrose hepática. O método é muito preciso para o diagnóstico de ausência (com resultado < 0,1) ou presença (>0,6) de fibrose significativa, mas é pouco útil na avaliação de estágios intermediário. É utilizado muitas vezes em substituição à biópsia hepática pré e pós tratamento.

MELD

O Modelo para Doença Hepática Terminal (Model for End-Stage Liver Disease) é uma escala numérica criada para avaliação da gravidade da doença hepática, em uma escala de 6 a 40, utilizando um algoritmo matemático baseado em três variáveis: bilirrubina total, RNI e creatinina (que mede a função do rim). O MELD, pelo seu perfil de reprodutibilidade e disponibilidade, ganhou mais importância no Brasil em 29 de março de 2006, quando o Ministério da Saúde publicou a Portaria 1.160, modificando o funcionamento da ordem da lista de transplante de fígado de cronológica para gravidade, baseada neste critério.

Fontes:
http://www.hepcentro.com.br/exames.htm
Burtis, C., Ashwood, E., Bruns, D. Tietz Fundamentals of Clinical Chemistry, 5.ed. Elsevier (Halbourn, 2007)

sábado, 8 de novembro de 2014

7ª Postagem: Carcinoma hepatocelular



O hepatocarcinoma (ou carcinoma hepatocelular - CHC) é o câncer primário do fígado, ou seja, o câncer derivado das principais células do fígado - os hepatócitos Essa mutação pode ser causada por algum agente externo (como o vírus da hepatite B) ou pelo excesso de multiplicações das células (como a regeneração crônica nas hepatites), o que aumenta o risco de surgimento de erros na duplicação dos genes. O hepatocarcinoma é caracteristicamente agressivo, com altíssimo índice de óbito após o início dos sintomas (icterícia,ascite e outros). Se for detectado apenas na fase sintomática, o paciente tem expectativa de vida média inferior a um mês se não for realizado nenhum tratamento, sendo que nessa fase os tratamentos disponíveis são limitados e pouco eficazes.


Fígado cortado mostrando hepatocarcinoma cortado ao meio

O hepatocarcinoma é, atualmente, o quinto câncer mais comum em homens e o oitavo em mulheres. Globalmente, a incidência anual é de 560.000 novos casos ao ano. A cirrose hepática, independente da causa, é o principal fator de risco para o surgimento do CHC. Considera-se que o portador de cirrose compensada (sem sintomas,Child-Pugh A) tem um risco de desenvolver CHC de cerca de 5% ao ano. Situações específicas na evolução da cirrose estão associadas a uma maior incidência de CHC - na hemorragia por varizes esofágicas, 15%; na peritonite bacteriana espontânea, 20%.

SINTOMAS

Sintomas mais freqüentes no hepatocarcinoma (Japão)
Sintoma
%
Mal-estar geral
60,5
Dor abdominal
46,2
Sensação de abdome cheio
44,9
Perda do apetite
44,7
Perda de peso
28,9
Ascite (acúmulo de líquido no abdome)
26,5
Tumor palpável
23,3
Inchaço nas pernas
16,8
Icterícia (pele e olhos amarelados)
16,7
Febre
16,7
Náusea e vômitos
15,6
Vômitos ou fezes com sangue
7,6

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Alfetoproteína por ser uma importante proteína plasmática do bebê indica, portanto, regenaração hepatocelular. A dosagem de alfa-feto proteína é o mais difundido marcador tumoral empregado para rastreamento e seguimento do CHC ao redor do mundo. Vários estudos demonstraram que alfa-feto proteína elevada é fator de pior prognóstico em relação à agressividade da doença estando assim atrelada, em níveis elevados, à tumores de diâmetros maiores e invasão vascular. 
Baixa sensibilidade – 45-64%
Valores abaixo de 20 ng/dL – VPN > 90%
É considerado específico se > 400 ng/dL
Valores entre 20-400 – população com odds ratio 14 para hepatocarcinoma

TRATAMENTO
A melhor opção, apesar de muito agressiva, ainda é o transplante do fígado, onde o órgão doente é substituído por outro sadio. Outra opção é a hepatectomia, cirurgia onde é retirada a porção do fígado onde está localizado o tumor. Uma terceira opção, muito utilizada pelos japoneses e que aos poucos vem se tornando difundida pelo mundo é o tratamento percutâneo (pela pele) do tumor. Nessa modalidade terapêutica, o tumor é destruído sem a necessidade de cirurgia. A injeção percutânea de etanol (PEI) é um método simples, realizado sob anestesia local e com raras complicações. 

Referências:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-67202011000100009
http://www.hepcentro.com.br/hepatocarcinoma.htm

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

6ª Postagem: Ascite em pacientes cirróticos


Nessa postagem falaremos sobre ascite, a mais comum das complicações da cirrose, ocorrendo em mais de 50% dos pacientes com 10 anos de diagnóstico da doença. Trata-se de um importante marcador prognóstico no paciente cirrótico, uma vez que sinaliza que a doença está avançada e está relacionada ao aparecimento de outras complicações da cirrose. Cerca de 50% dos pacientes que desenvolvem ascite morrem em 2 anos.
Também conhecida como "barriga d´água" ou hidroperitônio é o nome dado ao acúmulo de líquido no interior do abdome. Esse líquido pode ter diversas composições, como linfa, bile, suco pancreático, urina. Mas, no contexto de doença do fígado com hipertensão portal (cirrose, esquistossomose, Síndrome de Budd-Chiari e outras), a ascite é o extravasamento do plasma sanguíneo para o interior da cavidade abdominal, principalmente através do peritônio, provocado por uma somatória de fatores.


Paciente com ascite severa.

Classificação:

- Grau 1: ascite leve, detectável apenas ao exame ultra-sonográfico.
- Grau 2: ascite moderada, caracterizada pela distensão moderada e simétrica do abdome.
- Grau 3: distensão abdominal importante.

Fisiopatologia da doença

Com o aumento da resistência ao fluxo de sangue através do fígado (pela desorganização estrutural e/ou contração dos sinusóides na doença hepática), há um aumento na pressão em todas as veias que confluem na veia porta (sistema porta hepático). Essas veias, que provém da maioria dos órgãos do abdome, tornam-se dilatadas (pela pressão interna aumentada e pela ação de vasodilatadores), levando ao extravasamento de um líquido filtrado do sangue que "escapa" dos vasos. O órgão que é responsável pela maior parte da produção do líquido ascítico é o peritônio, uma membrana que reveste a parte interior do abdome e alguns dos seus órgãos e que é permeável, tanto ao extravasamento de líquido para a formação da ascite, quanto à absorção do líquido durante o tratamento.
Além disso, na cirrose, a quantidade de albumina pode estar reduzida (hipoalbuminemia) por dois motivos principais: a desnutrição, que é comum na cirrose avançada, ou a falência na produção da albumina, que é realizada exclusivamente no fígado, que está comprometido. Sem a quantidade adequada de albumina, a pressão oncótica nos vasos sangüíneos diminui, o que torna mais "fácil" o extravasamento do plasma que está sendo "empurrado" pelo aumento na pressão do sistema porta.

Paracentese e análise do líquido ascítico

Paracentese é um procedimento médico que envolve a punção de fluido da cavidade peritoneal no abdômen. Importante no diagnóstico da causa da ascite como também na exclusão da peritonite bacteriana espontânea (PBE). As complicações da paracentese são raras e ela deve ser evitada apenas nos casos de fibrinólise ou coagulação intravascular disseminada clinicamente evidentes. Pacientes pIaquetopênicos (< 50.000/mm3) devem ser avaliados caso a caso, sendo prudente a correção com concentrado de plaquetas nos pacientes de maior risco para sangramento.

Referências
http://www.hepcentro.com.br/ascite.htm 
http://www.psiquiatriageral.com.br/farma/paciente_cirrotico.htm
http://pt.wikipedia.org/wiki/Paracentese

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

5ª Postagem: Encefalopatia Hepática

A encefalopatia hepática ou porto-sistêmica é uma síndrome clínica muito comum em portadores de doença hepática crônica, acometendo de 50% a 70% dos cirróticos no curso da sua doença. Trata-se de uma manifestação de doenças no fígado, aonde há um excesso de produtos tóxicos provenientes da alimentação e do próprio fígado, que deveria eliminá-las. A encefalopatia surge quando o fígado torna-se incapaz de eliminar ou transformar esses tóxicos em virtude da destruição das suas células e/ou porque o sangue que vem do sistema digestivo é desviado do seu caminho normal e vai direto para a circulação geral (incluindo a do cérebro) sem passar pelo fígado antes.

FISIOPATOGENIA

Não há uma explicação clara para o surgimento da encefalopatia hepática. A maioria das teorias baseia-se na comprovação de que a concentração de amônia no sangue está aumentada nos cirróticos, especialmente naqueles com encefalopatia. A amônia é produzida principalmente no intestino e deveria ser transformada em uréia (ou glutamina, a partir de glutamato) pelo fígado e eliminada pelas fezes e urina. Essa amônia em excesso, no cérebro, afeta os neurotransmissores e portanto o funcionamento cerebral. Os efeitos da amônia no cérebro incluem a redução nos potenciais pós-sinápticos, aumento na captação de triptofano (cujos metabólitos, entre eles a serotonina, são neuroativos), redução no ATP com perda de energia e o aumento da osmolaridade intracelular dos astrócitos (pela formação de glutamina), que leva ao seu inchaço e vasodilatação cerebral.
Diversas outras teorias ajudam a explicar a encefalopatia hepática, pois a concentração de amônia no sangue, apesar de aumentada na encefalopatia, não está diretamente relacionada ao grau da doença. Excesso de mercaptanos, manganês e de ácidos graxos de cadeia curta, desequilíbro entre aminoácidos aromáticos e não aromáticos, são outras explicações para a doença.

SINTOMAS

A grande maioria dos cirróticos portadores de encefalopatia hepática não apresenta nenhuma queixa. Há apenas uma discreta lentificação e redução da atenção, que podem ser detectados com exames específicos. Esse é considerado o estágio subclínico da doença e pode afetar de 1/3 a 2/3 dos cirróticos. A importância desse estágio é controversa, mas há evidências de que nessa fase há um risco aumentado de acidentes, especialmente automobilísticos.
Com a progressão da doença, há graus progressivos de encefalopatia, que pode cursar com alterações no comportamento social (palavras inapropriadas, agitação, agressividade, comportamento bizarro), mudança no ciclo sono-vigília (sono de dia, insônia à noite), fala arrastada, sonolência e, por fim, coma. Geralmente há alguns sinais durante esse processo, como tremores e um hálito adocicado característico.

Estágios da Encefalopatia Hepática - Critérios de West Haven
Estágio
Consciência
Intelecto e Comportamento
Achados Neurológicos
0
Normal
Normal
Exame normal; testes psicomotores prejudicados
1
Leve perda de atenção
Redução na atenção; adição e subtração prejudicadas
Tremor ou flapping leve
2
Letárgico
Desorientado; comportamento inadequado
Flapping evidente; fala arrastada
3
Sonolento mas responsivo
Desorientação severa; comportamento bizarro
Rigidez muscular e clonus; hiperreflexia
4
Coma
Coma
Postura de descerebração

A encefalopatia hepática, no entanto, não costuma aparecer na forma de uma piora progressiva, contínua e irreversível. Ela pode aparecer subitamente na hepatite fulminante (com melhora completa se houver cura) ou com períodos de melhora e piora, característicos na cirrose. No cirrótico, a encefalopatia vai se manifestar como surtos de piora quando houver uma causa desencadeante e melhorar quando essa causa passar ou for tratada.

DIAGNÓSTICO

O diagnóstico de encefalopatia hepática é geralmente de exclusão, devendo-se atentar para a presença de sinais e sintomas que sugiram outra etiologia para alteração no nível de consciência, como déficits focais, alteração em pares cranianos ou irritação meníngea. Fatores predisponentes também auxiliam na suspeita diagnóstica e incluem: o aumento da produção de amônia ou da difusão de amônia pela barreira hemato-encefálica (por uremia, hemorragia digestiva, infecção, entre outras), o comprometimento da perfusão hepática (por hipovolemia, paracentese), drogas depressoras do sistema nervoso (benzodiazepínicos, opióides), "shunt" porto-sistêmico (TIPS, cirúrgico) e diminuição da reserva funcional hepática (progressão da hepatopatia, hepatocarcinoma).

Referência:
http://www.hepcentro.com.br/encefalopatia_hepatica.htm
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-42302004000200012


sábado, 18 de outubro de 2014

4ª Postagem: Testes para avaliação de lesão hepatocelular e suas implicações

O termo "função hepática" geralmente é utilizado erroneamente na prática clínica para descrever uma gama de exames laboratoriais que não investigam apenas a função do fígado, mas também a presença de lesão hepatocelular e de vias biliares. Costuma incluir AST, ALT, fosfatase alcalina, GGT, albumina, bilirrubinas total e frações e atividade da protrombina. Há, no entanto, uma grande variedade de exames laboratoriais disponíveis comercialmente que apresentam como finalidade avaliar paciente com suspeita de doença hepática ou investigar sua causa. Os exames podem ser classificados de modo didático em:
Testes para avaliação de lesão hepatocelular (destruição de hepatócitos);
Testes para avaliação do fluxo biliar e lesão de vias biliares;
Testes para avaliação da função de síntese do fígado;
Testes para avaliação de complicações e estágio da cirrose;
Testes para investigação da etiologia (causa) da doença hepática.
A maioria das doenças hepáticas causam somente leves sintomas inicialmente, então estes testes são vitais para que estas doenças sejam detectadas precocemente. O envolvimento do fígado em algumas doenças pode ser de importância crucial. Estes testes são realizados através de amostra obtida do sangue do paciente. Nessa postagem falaremos mais especificamente dos testes para avaliação de lesão hepatocelular. 
Testes para avaliação de lesão hepatocelular
  1. Aminotransferase

    • Aspartato aminotransferase (AST)

Também pode ser chamada de transaminase glutâmico oxaloacética (TGO). É uma enzima que catalisa a reação: aspartato + alfa-queroglutarato = oxaloacetato + glutamato. Encontrada em altas concentrações no citoplasma e nas mitocôndrias do fígado, músculos esquelético e cardíaco, rins, pâncreas e eritrócitos (glóbulos vermelhos do sangue). Quando qualquer um desses tecidos é lesado, a AST é liberada no sangue como não há um método laboratorial para saber qual a origem da AST encontrada no sangue, o diagnóstico da causa do seu aumento deve levar em consideração a possibilidade de lesão em qualquer um dos órgãos onde é encontrada. Seus valores normais: até 31 U/L (mulheres) e 37 U/L (homens).



  • Alanina aminotransferase (ALT)
Também pode ser chamada de transaminase glutâmico pirúvica (TGP). É uma enzima que catalisa a reação: alanina + alfa-queroglutarato = piruvato + glutamato. É encontrada em altas concentrações apenas no citoplasma do fígado, o que torna o seu aumento mais específico de lesão hepática. Seus valores normais: até 31 U/L (mulheres) e 41 U/L (homens).




Microscopia eletrônica de hepatócito. As mitocôndrias (M) são organelas responsáveis principalmente pela produção de energia nas células. O citoplasma é o espaço da célula entre o núcleo (essa estrutura circular que ocupa grande parte da figura) e a membrana celular, que reveste a célula. É preenchido por uma matéria semi-fluida denominada hialoplasma aonde estão suspensas as organelas da célula.

  • Relação AST/ALT
Além das características individuais, a relação entre o aumento das enzimas tem valor diagnóstico tanto a AST quanto a ALT costumam subir e descer quase na mesma proporção em doenças hepáticas. Elevações pequenas de ambas, ou apenas de ALT em pequena proporção, são encontradas na hepatite crônica (especialmente hepatite C e esteato-hepatite não alcoólica). Como na hepatite alcoólica há maior lesão mitocondrial, proporcionalmente, do que nas outras hepatopatias, observa-se tipicamente elevação mais acentuada (o dobro ou mais) de AST (que é encontrada nas mitocôndrias) do que de ALT, ambas geralmente abaixo de 300 U/L. Elevações de ambas acima de 1.000 U/L são observadas em hepatites agudas virais ou por drogas

Causas de aumento de aminotransferases no sangue
Doenças hepatobiliares
Doenças do miocárdio
Doença pancreática
Doença muscular
Álcool
Ligação a imunoglobulina (rara)
Doença não-hepatobiliar com envolvimento hepático obesidade / diabetes
  -hemocromatose
deficiência de alfa-1-antitripsina
  -infecção pelo HIV
hipertireoidismo
  -doença celíaca
  • Desidrogenase lática (DHL)
É observado em lesões hepatocelulares, de modo geral, pode ser útil na diferenciação entre hepatite aguda viral e lesão causada por isquemia ou paracetamol; sugere-se que, em elevações de aminotransferases acima de 5 vezes o limite superior, uma relação ALT/DHL maior que 1,5 sugere hepatite viral. Valores normais: 24-480 U/L

Referências:
http://www.hepcentro.com.br/exames.htm
http://www.ebah.com.br/content/ABAAAASNAAA/enzimas-hepaticas